O que são LLMs e como funcionam
Os Modelos de Linguagem de Grande Escala (Large Language Models ou LLMs) representam um dos avanços mais significativos na área de Inteligência Artificial nas últimas décadas. Nesta aula, vamos explorar o que são esses modelos, como eles evoluíram ao longo do tempo e os princípios fundamentais por trás de seu funcionamento.
Definição e Propósito dos LLMs
Um Modelo de Linguagem de Grande Escala é um tipo de sistema de IA projetado para compreender, gerar e manipular linguagem natural de forma que se aproxime da capacidade humana. Diferentemente dos sistemas de processamento de linguagem natural (NLP) tradicionais, que eram frequentemente projetados para tarefas específicas como classificação de sentimentos ou tradução, os LLMs são modelos de propósito geral capazes de realizar uma ampla variedade de tarefas linguísticas.
O propósito fundamental de um LLM é modelar a probabilidade de sequências de palavras ou tokens. Em termos simples, dado um contexto (uma sequência de tokens), o modelo prevê quais tokens têm maior probabilidade de aparecer em seguida. Esta capacidade aparentemente simples é o que permite que os LLMs realizem tarefas impressionantes como:
- Gerar texto coerente e contextualmente relevante
- Responder perguntas com base em conhecimento adquirido durante o treinamento
- Resumir textos longos
- Traduzir entre idiomas
- Escrever código de programação
- Raciocinar sobre problemas complexos
História e Evolução dos Modelos de Linguagem
A jornada até os LLMs modernos foi longa e marcada por várias inovações importantes:
1. Modelos Estatísticos (1980s-2000s)
Os primeiros modelos de linguagem eram puramente estatísticos, baseados em n-gramas. Estes modelos calculavam a probabilidade de uma palavra aparecer com base nas n palavras anteriores. Por exemplo, um modelo de trigrama (n=3) estimaria P(palavra₃|palavra₁,palavra₂).
Limitações: Estes modelos tinham "memória" muito curta e não conseguiam capturar dependências de longo alcance no texto.
2. Redes Neurais Recorrentes (RNNs) (2010-2015)
As RNNs representaram um avanço significativo, pois podiam, teoricamente, manter informações por sequências arbitrariamente longas através de seu estado oculto.
class SimpleRNN:
def __init__(self, input_size, hidden_size, output_size):
self.hidden_size = hidden_size
# Pesos para a entrada
self.W_xh = np.random.randn(hidden_size, input_size) * 0.01
# Pesos para o estado oculto
self.W_hh = np.random.randn(hidden_size, hidden_size) * 0.01
# Pesos para a saída
self.W_hy = np.random.randn(output_size, hidden_size) * 0.01
# Bias
self.b_h = np.zeros((hidden_size, 1))
self.b_y = np.zeros((output_size, 1))
def forward(self, inputs, h_prev):
# Armazenar todos os estados ocultos
h = np.zeros((len(inputs), self.hidden_size))
h[-1] = h_prev
# Saídas
y = np.zeros((len(inputs), self.W_hy.shape[0]))
# Percorrer a sequência
for t in range(len(inputs)):
# Atualizar o estado oculto
h[t] = np.tanh(np.dot(self.W_xh, inputs[t]) + np.dot(self.W_hh, h[t-1]) + self.b_h)
# Calcular a saída
y[t] = np.dot(self.W_hy, h[t]) + self.b_y
return y, h
Limitações: Na prática, as RNNs sofriam do problema de desvanecimento do gradiente (vanishing gradient), o que dificultava o aprendizado de dependências de longo prazo.
3. LSTMs e GRUs (2014-2017)
As Long Short-Term Memory networks (LSTMs) e Gated Recurrent Units (GRUs) foram projetadas para resolver o problema do desvanecimento do gradiente através de mecanismos de "portas" que controlavam o fluxo de informação.
class SimpleLSTM:
def __init__(self, input_size, hidden_size):
# Inicialização de pesos para as portas de entrada, esquecimento, saída e célula
self.W_ii = np.random.randn(hidden_size, input_size)
self.W_hi = np.random.randn(hidden_size, hidden_size)
self.b_i = np.zeros((hidden_size, 1))
self.W_if = np.random.randn(hidden_size, input_size)
self.W_hf = np.random.randn(hidden_size, hidden_size)
self.b_f = np.zeros((hidden_size, 1))
self.W_io = np.random.randn(hidden_size, input_size)
self.W_ho = np.random.randn(hidden_size, hidden_size)
self.b_o = np.zeros((hidden_size, 1))
self.W_ig = np.random.randn(hidden_size, input_size)
self.W_hg = np.random.randn(hidden_size, hidden_size)
self.b_g = np.zeros((hidden_size, 1))
def forward(self, x, h_prev, c_prev):
# Porta de entrada
i = sigmoid(np.dot(self.W_ii, x) + np.dot(self.W_hi, h_prev) + self.b_i)
# Porta de esquecimento
f = sigmoid(np.dot(self.W_if, x) + np.dot(self.W_hf, h_prev) + self.b_f)
# Porta de saída
o = sigmoid(np.dot(self.W_io, x) + np.dot(self.W_ho, h_prev) + self.b_o)
# Candidato a novo valor de célula
g = np.tanh(np.dot(self.W_ig, x) + np.dot(self.W_hg, h_prev) + self.b_g)
# Atualização do estado da célula
c_next = f * c_prev + i * g
# Atualização do estado oculto
h_next = o * np.tanh(c_next)
return h_next, c_next
Estas arquiteturas permitiram avanços significativos em tarefas de processamento de linguagem natural, mas ainda enfrentavam desafios com textos muito longos.
4. Arquitetura Transformer (2017-presente)
A verdadeira revolução veio com a introdução da arquitetura Transformer no artigo "Attention is All You Need" (2017). O Transformer substituiu a natureza sequencial das RNNs por um mecanismo de atenção que permitia ao modelo considerar diretamente todas as palavras em uma sequência, independentemente de sua distância.
Principais inovações do Transformer:
- Mecanismo de auto-atenção: Permite que o modelo pese a importância de diferentes palavras em relação umas às outras.
- Processamento paralelo: Ao contrário das RNNs, os Transformers podem processar todas as palavras de uma sequência simultaneamente.
- Embeddings posicionais: Como o modelo não é sequencial por natureza, informações sobre a posição das palavras são adicionadas explicitamente.
5. Era dos LLMs (2018-presente)
Com base na arquitetura Transformer, surgiram modelos cada vez maiores e mais capazes:
- BERT (2018): Bidirectional Encoder Representations from Transformers, focado em compreensão de linguagem.
- GPT (2018) e suas iterações: Generative Pre-trained Transformer, focado em geração de texto.
- T5 (2019): Text-to-Text Transfer Transformer, que unifica várias tarefas de NLP.
- GPT-3 (2020): Demonstrou capacidades emergentes com 175 bilhões de parâmetros.
- LLaMA, Falcon, Mistral (2023): Modelos de código aberto com desempenho competitivo.
- GPT-4 (2023): Demonstrou capacidades ainda mais avançadas de raciocínio e compreensão.
Arquiteturas Principais: RNN, LSTM, Transformer
Vamos comparar as três principais arquiteturas que marcaram a evolução dos modelos de linguagem:
RNN (Rede Neural Recorrente)
Princípio de funcionamento: Processa dados sequencialmente, mantendo um "estado oculto" que é atualizado a cada passo de tempo.
Vantagens:
- Conceito simples e intuitivo
- Uso eficiente de parâmetros
- Adequado para sequências de comprimento variável
Desvantagens:
- Problema do desvanecimento/explosão do gradiente
- Dificuldade em capturar dependências de longo prazo
- Processamento sequencial lento
LSTM (Long Short-Term Memory)
Princípio de funcionamento: Estende as RNNs com mecanismos de "portas" que controlam o fluxo de informação, permitindo que o modelo retenha informações por períodos mais longos.
Vantagens:
- Melhor capacidade de memorização de longo prazo
- Mais resistente ao problema do desvanecimento do gradiente
- Bom desempenho em tarefas que exigem contexto temporal
Desvantagens:
- Mais complexo e computacionalmente intensivo que RNNs simples
- Ainda processa sequencialmente
- Limitações práticas em sequências muito longas
Transformer
Princípio de funcionamento: Utiliza mecanismos de atenção para pesar a importância relativa de diferentes partes da entrada, independentemente de sua posição na sequência.
Vantagens:
- Processamento paralelo (não sequencial)
- Capacidade de capturar dependências de longo alcance
- Escalabilidade para modelos muito grandes
Desvantagens:
- Complexidade computacional quadrática em relação ao comprimento da sequência
- Requer grandes quantidades de dados e recursos computacionais
- Limitação no comprimento do contexto (janela de atenção)
Diferenças entre GPT, BERT, T5 e outros modelos populares
Embora todos sejam baseados na arquitetura Transformer, estes modelos diferem significativamente em sua abordagem e aplicações:
GPT (Generative Pre-trained Transformer)
- Arquitetura: Apenas decoder do Transformer
- Treinamento: Autoregressivo (prevê o próximo token com base nos anteriores)
- Especialidade: Geração de texto
- Contexto: Unidirecional (da esquerda para a direita)
- Aplicações: Escrita criativa, chatbots, resumos, tradução
BERT (Bidirectional Encoder Representations from Transformers)
- Arquitetura: Apenas encoder do Transformer
- Treinamento: Masked Language Modeling (prevê palavras mascaradas aleatoriamente)
- Especialidade: Compreensão de linguagem
- Contexto: Bidirecional (considera palavras antes e depois)
- Aplicações: Classificação de texto, resposta a perguntas, análise de sentimentos
T5 (Text-to-Text Transfer Transformer)
- Arquitetura: Encoder-decoder completo
- Treinamento: Todas as tarefas são formuladas como problemas de texto para texto
- Especialidade: Versatilidade em múltiplas tarefas
- Contexto: Bidirecional no encoder, unidirecional no decoder
- Aplicações: Tradução, resumo, classificação, resposta a perguntas
BART (Bidirectional and Auto-Regressive Transformers)
- Arquitetura: Encoder-decoder completo
- Treinamento: Corrompe o texto e aprende a reconstruí-lo
- Especialidade: Tarefas generativas com compreensão bidirecional
- Aplicações: Resumo, geração de texto, tradução
RoBERTa (Robustly Optimized BERT Approach)
- Arquitetura: Similar ao BERT, com otimizações
- Treinamento: Treinado por mais tempo, com mais dados e lotes maiores
- Especialidade: Melhor desempenho em tarefas de compreensão
- Aplicações: Similares ao BERT, mas com maior precisão
Conclusão
Os LLMs representam o estado da arte em processamento de linguagem natural, com capacidades que continuam a surpreender e expandir. A evolução desde os modelos estatísticos simples até os Transformers massivos de hoje ilustra o rápido progresso neste campo.
No próximo tópico, exploraremos os requisitos de hardware para trabalhar com LLMs e as técnicas de otimização que nos permitirão construir e treinar esses modelos mesmo com recursos computacionais limitados.
Referências e Leituras Adicionais
- Vaswani, A., et al. (2017). "Attention Is All You Need". Neural Information Processing Systems.
- Devlin, J., et al. (2018). "BERT: Pre-training of Deep Bidirectional Transformers for Language Understanding".
- Radford, A., et al. (2018). "Improving Language Understanding by Generative Pre-Training".
- Brown, T., et al. (2020). "Language Models are Few-Shot Learners".
- Raffel, C., et al. (2019). "Exploring the Limits of Transfer Learning with a Unified Text-to-Text Transformer".